Destaque de Documentação Gráfica

Santiago Mata-Mouros na Gravura e na Pintura.

 

Nas últimas folhas dum Missal Romano, datado de 1619, produzido em Antuérpia, pertença da igreja de S. Miguel de Cernadela (Cortiços), encontrava-se destacada a folha de rosto dum Missal Propriae, com a data impressa de 1620. No centro da folha há uma estampa do apóstolo Tiago, o Maior, representado como cavaleiro ou como Santiago Mata-Mouros, cavalgando à frente das tropas cristãs de Ramiro I, na Batalha de Clavijo, em 844, em direcção às tropas muçulmanas que logo batem em retirada. A estampa encontra-se assinada pelo autor, Michel Lasne, M. Lasne in, contudo a data foi desprezada durante os preparos de impressão.

Os intervenientes da batalha distinguem-se perfeitamente na estampa através da iconografia. Cada exército exibe uma insígnia, no caso das tropas cristãs, perfiladas no lado direito do observador, o estandarte tem pintado uma cruz grega. As tropas muçulmanas, dispostas no lado esquerdo do campo de batalha, têm no seu estandarte o crescente lunar. No plano principal, sabemos que os dois soldados que se encontram prostrados diante de Santo Tiago pertencem às hostes muçulmanas, pois a espada que está junto aos seus corpos é curva. A figura central é Santo Tiago, os seus atributos são: a vieira (no chapéu, bolsa e capa de peregrino) e o escudo com a cruz da Ordem de Santiago.

Segundo os mitos, Santo Tiago ora terá aparecido num sonho ao rei Raimundo I assegurando-lhe a vitória no dia seguinte, ora terá surgido a combater ao lado das tropas durante o confronto, conduzindo-as ao triunfo.

Na mesma linha, é interessante notar que na igreja de Santo Tiago, em Corujas, existe a exacta correspondência da estampa acima referida num painel do antigo retábulo-mor. Inicialmente pensou-se que o retábulo, entretanto redimensionado, seria de finais do século XVI, agora, com mais segurança, podemos fixá-lo nas primeiras décadas do século XVI.

Aliás, como avançou o Professor Doutor Vitor Serrão, coordenador científico do projecto, são conhecidos outros exemplares idênticos, como é o caso da pintura procedente da igreja de Santo Agostinho de Moura e que se encontra no actual Museu de Arte Sacra da mesma cidade (a respeito disto, vide artigo Dez núcleos de Pintura da Idade Moderna na Região das Terras Quentes (Concelho de Macedo de Cavaleiros), Séculos XVI, XVII e XVIII, da autoria de Vitor Serrão, publicado nos Cadernos “Terras Quentes” n.º 2).

Poucas dúvidas restam sobre a utilização desta gravura como suporte compositivo no painel central destas tábuas de Corujas e de modo totalmente coincidente, diferindo apenas nalguns aspectos menores como no caso da cruz espatária do escudo do santo. Ainda noutros locais do concelho se pôde confirmar semelhantes apropriações, porém doutros temas, caso do retábulo epimaneirista da Igreja de S. Vicente de Vinhas, com a Adoração dos Pastores, ou da tela dedicada a Santo Domingos de Gusmão da igreja de Nossa Senhora dos Reis de Lamalonga.

O retábulo é constituído por três painéis e predela. No painel central, figura Santo Tiago, o Maior, o orago da igreja e nos painéis laterais estão representados, no lado esquerdo, Santo Pedro e, no direito, Santo Paulo. Na predela, estão representados, da esquerda para a direita, Santa Apolónia, Santo António e Santa Luzia.