1. Identificação da obra e processo de recuperação

A identificação da imagem Jesus Flagelado, separada do ciclo dos Passos da Paixão da igreja de S. Pedro, em meados de 1861, foi feita num conhecido antiquário lisboeta, por um colaborador da Associação Terras Quentes[1], enquanto investigador externo do Instituto de História da Arte (IHA) – FLUL (2005), e de imediato comunicada aos historiadores de arte responsáveis pelo projecto de inventariação do património histórico-artístico do concelho de Macedo de Cavaleiros (em curso) e ao abrigo de um protocolo assinado entre a Câmara Municipal de Macedo de cavaleiros, a Faculdade de Letras, através do IHA e do Departamento de História, a Associação Terras Quentes e, mais recentemente, a Diocese de Bragança-Miranda.

A descoberta levou a um processo de recuperação concretizado em parceria entre o Município, nas pessoas do Presidente, Eng.º Beraldino Pinto, e Vereadores, Eng.ª Sílvia Garcia e Dr. Manuel Cardoso, a Associação Terras Quentes, nas pessoas do Dr. Carlos Mendes e de Maria Belmira Cordeiro Mendes, o IHA, na pessoa do Professor Doutor Vítor Serrão, e a Polícia Judiciária, nas pessoas da Dr.ª Leonor de Sá e da inspectora Teresa Esteves.

2. A igreja de S. Pedro e a capela dos Passos da Paixão

Em 1758 pela pena do Reitor Aleixo Borges da Cruz ficamos a saber que a igreja de São Pedro era composta por “[…] um [altar] das Almas, outro de São José, outro de Nossa Senhora do Rosário, outro na capela mor que é de São Pedro, outro do Santo Nome de Jesus, outro de Santa Cruz. Em todos estes se diz missa. Tem duas naves, frontispício. Tem duas irmandades, uma do Santíssimo Sacramento e outra da Santa Cruz […]”[2].

A igreja que o Reitor Aleixo Borges da Cruz nos dá a conhecer em 1758 difere, muito, da actual igreja de São Pedro. Na verdade a actual igreja matriz de Macedo de Cavaleiros é o resultado de várias campanhas de obras, a última das quais pelos anos de 1860/61[3]. Esta última campanha deverá ter como resultado as obras da torre sineira, adossada à fachada principal, a supressão de uma nave e de duas capelas.

A extinção e consequente espoliação de duas capelas funcionou como fonte de receita para o pagamento das obras estruturais efectuadas em meados do século XIX, altura em que a imagem de Jesus Flagelado terá sido separada do ciclo dos Passos da Paixão.

A Capela da Paixão, da igreja de São Pedro, é emoldurada por um arco de volta perfeita peraltado, em granito, com intradorso decorado com grotesco, cobertura octogonal em madeira, retábulo em linhas protobarrocas e panos murais laterais revestidos a talha dourada e policromada barroca.

As laterais da capela, datáveis da última década de 1600, são constituídas nos registos inferiores por um dois pares de nichos, onde se incluem os Passos da Paixão.

3. Jesus Flagelado no ciclo da Paixão

No primeiro contacto que houve entre a equipa responsável pelo Inventário do Património Histórico-Artístico do Concelho de Macedo de Cavaleiros e a capela dos Passos da Paixão, na igreja de S. Pedro do mesmo lugar, logo se constatou a ausência de uma ou duas imagens que completassem o ciclo da Paixão de Jesus. Era notória a lacuna, no nicho onde deveria ser recriado o tempo da Flagelação de Jesus estava a imagem de Nossa Senhora de Fátima, da segunda metade do século XX. No retábulo frontal, da segunda metade do século XVII, estava a imagem Jesus a Caminho do Calvário (Senhor dos Passos), dois séculos posterior ao retábulo e ao conjunto escultórico dos Passos da Paixão.

Estas introduções, ainda que não corrompessem a leitura global do conjunto, quebravam a sua eficácia.

Hoje, com a reintegração de Jesus Flagelado no conjunto, a leitura e a força originais são repostas. Desde o tempo da Oração de Jesus até ao tempo da Coroação de Espinhos, todos estão agora representados.

O conjunto escultórico dos Passos da Paixão da igreja de São Pedro de Macedo de Cavaleiros é composto por cinco imagens de vulto pleno, de dimensões pouco variáveis, talhadas em madeira, em módulos ensamblados, tendo como técnicas de superfície a policromia, o douramento e o esgrafitado. As cinco imagens representam cinco momentos da Paixão, a Oração de Jesus, Jesus Manietado, Jesus Flagelado, Jesus Entronizado no Lajedo e Jesus Morto na Cruz.

 

[1] Sérgio Abelha. Licenciado em História da Arte pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL).
[2] Cardoso, Luís, Dicionário Geográfico do Reino, tomo de Bragança, vol.XXIX.
[3] Data insculpida e pintada na pedra de fecho do arco cruzeiro e que deverá indicar a última campanha de obras.